Em sua coluna semanal, a senadora Gleisi Hoffmann (PT) analisa os motivos da rejeição, por parte do “mercado”, para o pacote de ajuste fiscal implementado pela presidenta Dilma Rousseff (PT) visando superar a crise mundial. Gleisi conclui que o mercado esperava medidas mais duras com os mais pobres, que seriam cortes nos programas sociais do governo, e isso, segundo ela, Dilma não fez. Leia, comente e compartilhe o texto.
Gleisi Hoffmann*
Passamos a semana tentando entender as análises de economistas, articulistas de mercado, empresários, políticos, movimentos sociais, intelectuais de esquerda sobre o ajuste fiscal anunciado pelo governo da presidenta Dilma na segunda-feira passada.
Em comum, quase todos, sob sua perspectiva, criticaram o pacote; mas o mercado, este ente quase invisível, além das críticas mais fortes, externou decepção total.
Analistas esperavam um grande corte nas despesas, aquele chamado corte na carne, que para o mercado seria em cima de programas sociais, como bolsa família, programas de educação, saúde e assim por diante. É sempre assim, quando as coisas apertam, sobra para os mais fracos.
Entretanto, a presidenta Dilma não deixou isso acontecer. Primeiro porque o orçamento de despesas já sofreu um forte ajuste em 2015 e o orçamento de 2016, objeto do atual ajuste, foi feito com base em 2015, com os cortes já feitos.
Para se ter ideia do corte de despesas, vale lembrar que o orçamento de 2015 foi inferior em R$ 40 bilhões em relação ao de 2014. Além disso, está com R$ 80 bilhões contingenciados, sem execução.
Por isso não é verdade que a proposta da presidenta é em cima do aumento da carga tributária. O ajuste começou no início deste ano, e foi pesado para as despesas, mas preservando os programas sociais mais estruturantes.
Cortar programas sociais só aumenta o drama dos mais pobres. Por isso a presidenta poupou esses programas. Mesmo o Minha Casa Minha Vida que sofreu ajuste, não foi para diminuir o programa, mas para adequá-lo a uma nova fonte de subsídio e a criação de mais uma faixa de financiamento.
Temos um problema de despesas com aumento exponencial que é a taxa de juros, que chega a 14,25%. Já pagamos, neste primeiro semestre de 2015, R$ 130 bilhões a mais de juros em relação ao mesmo período do ano passado. Mas sobre isso o mercado cala!
Mesmo os empresários, que costumavam reclamar dos juros, ficaram calados, porque quando a presidenta executou uma política que levou os juros para a casa dos 7,5%, eles não sustentaram. Aliás, muitos perderam dinheiro porque tinham mais retorno de aplicações financeiras do que de sua produção. Este é um dos motivos de termos uma indústria com baixa competitividade. Os juros precisam baixar, e rápido.
Se isto não acontecer, qualquer corte de despesa ou aumento de impostos não fará mais diferença daqui pra frente.
No lado da receita, a CPMF é com certeza o ponto mais polêmico. Penso que deveria ter uma faixa de isenção, para não atingir os de menor renda, assim como deveria ser dividido com Estados e municípios. Mas é um tributo não só arrecadatório é, principalmente, inibidor de caixa dois e transações ilegais. Vai ajudar o país neste momento, que precisa de receitas, mas, sobretudo, de instrumentos de fiscalização.
Também são importantes as alterações no Imposto de Renda sobre ganho de capital, que ficará progressivo, e no benefício chamado juros sobre capital próprio (JCP), o qual já tentamos mudar no relatório da MP 675, e o Congresso não permitiu. São ajustes que atingem o chamado andar de cima.
Espero, sinceramente, que o Congresso Nacional cumpra com seu dever na discussão e votação dessas medidas, pois tem grande responsabilidade sobre a situação fiscal no país hoje, uma vez que aumenta consideravelmente as despesas com os projetos que aprova e diminui as receitas com os inúmeros benefícios fiscais que concede.
*Gleisi Hoffmann é senadora da República pelo Paraná. Foi ministra-chefe da Casa Civil e diretora financeira da Itaipu Binacional. Escreve no Blog do Esmael às segundas-feiras.
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